“Christiane Amanpour Amor e Sexo pelo mundo” é uma série de reportagens disponível na Netflix que está fazendo muita gente repensar sobre a sexualidade voltada para o próprio umbigo.
Não sou muito fã de documentários, apesar de ter um irmão documentarista. Mais novinha era mais fã desse gênero, mas depois fui perdendo o interesse.
Até cheguei a assessorar aqui em Goiânia um festival de documentários. E lá, tive o prazer de ver produções marginais e ter momentaneamente um certo raro prazer por eles.
Acho que meu relacionamento com documentários é mais ou menos parecido quando vou me aventurar em algo novo no sexo. Eh! Tipo: não quero a princípio, mas a curiosidade me leva até o começo do caminho e depois me entrego totalmente.
E foi justamente assim que a série “Christiane Amanpour Amor e Sexo pelo Mundo” me conquistou.
Para captar um pedaço interessante da realidade é preciso saber fazer as perguntas certas.
Se tem algo que adoro em documentários é a realidade mostrada de forma viva, tão contrastante com a ficção. E para isso, você precisa de um bom repórter.
Coisa que já tinha notado nas produções do meu irmão. Para ter um depoimento impactante e cenas surpreendentes captadas na vida real, você precisa fazer as perguntas certas. Não vai ter outra chance, senão fica fake.
Então imagine você, o que consegue Christiane Amanpour com mais de 30 anos de carreira dedicadas à coberturas em zonas de guerra.
Logo percebi que conhecia aquela voz e aquela aparência de algum lugar… Quem não se lembra da Guerra do Golfo transmitida pela CNN? Era ela quem estava lá.
E também em muitos outros lugares difíceis: na Alemanha na queda do muro de Berlim, na guerra da Bósnia, Afeganistão, Palestina, Irã, Israel, Somália, Ruanda, Balcãs, e nos Estados Unidos durante o Furacão Katrina.
Esse trabalho lhe rendeu um bordão “Onde há guerra, há Amanpour”, escreveu o jornal americano The New York Times, em um perfil sobre a jornalista anglo-iraniana.
Além de seu trabalho em reportagens, a jornalista também produziu entrevistas exclusivas com diversos líderes mundiais. Incluindo os presidentes iranianos Mohammad Khatami e Mahmoud Ahmadinejad. Assim como presidentes do Afeganistão, Sudão e Síria, entre outros.
Após os Ataques de 11 de setembro de 2001, foi a primeira correspondente internacional a entrevistar o Primeiro-ministro britânico Tony Blair, o Presidente francês Jacques Chirac e o Presidente paquistanês Pervez Musharraf.
Outras entrevistas de grande destaque foram produzidas com Hillary Clinton, Nicolás Maduro, Hassan Rouhani e Muammar Gaddafi.
Da guerra para o prazer
E como então Christiane Amanpour foi parar num seriado sobre amor e sexo? Em um debate no South by Southwest (SXSW) ela declarou humildemente: “faço sexo ocasionalmente. Fiz um filho. Tenho algum conhecimento sobre o assunto.”
“Tive essa ideia enquanto escovava os dentes, em casa, antes de ir para o trabalho. O rádio noticiava a guerra na Síria. Pensei naquelas pessoas tentando manter a dignidade no meio de um derramamento de sangue. Como aquelas mulheres sírias mantém suas filhas a salvo de um casamento forçado? Elas falam de sexo? Como correspondente internacional, eu vivi experiências extremas, em condições extremas, em lugares extremos. Voltar a esses lugares para pesquisar sobre os hábitos sexuais pareceu uma forma de ver o lado oposto daquilo que eu cobria. Ver uma vida real”, conta a jornalista.
Seu prestígio passou confiança aos entrevistados. Seus contatos em tempos de guerra lhe rendeu uma boa produção, encontrando pessoas comuns, mas com histórias de vidas incríveis. Sua sensibilidade pelo ser humano fez as perguntas certas.
Depoimentos emocionantes e reveladores mostraram as tendências da intimidade sexual em Tóquio, Déli, Beirute, Berlim, Acra e Xangai. Em cada país você irá saber como se dá o sexo dentro e fora do casamento, as restrições impostas historicamente às mulheres, e como elas estão promovendo uma lenta libertação delas.
Vai ver como os homossexuais são vistos por essas culturas. Como a nova geração tem lidado com a tradição e reinventado a forma de se relacionar ( ou não. Há lugares onde a juventude está totalmente catatônica em relação ao assunto. Assiste pra saber qual é, senão vou dar spoiler de novo!)
Ciclos de retrocesso
Você consegue imaginar os tímidos japoneses de hoje, que nem se beijam em público, no período Edo (1603-1868) tendo relacionamentos abertos? A série começa assim: questionando como o Shunga, a arte erótica japonesa se perdeu durante a história.
Ou mesmo consegue entender como em um país que mais concentra templos religiosos com figuras eróticas do mundo, até hoje proíbe sexo fora do casamento? Já se questionou como a India produziu uma obra como o Kama Sutra e ainda tem tantos casos de assédio e estupros coletivos?
E porque o mundo árabe hoje ainda é tão repressor com as mulheres, se no século 15 surgiu o Jardim Perfumado, escrito de acordo com a teologia islâmica dando o mesmo peso para o prazer feminino e masculino, ensinando que o sexo deveria ser um ato prazeroso?
O que aconteceu para que esses países retrocedessem tanto em seus costumes relacionados com a sexualidade justamente na era moderna? Isso é o que eu achei de mais interessante nessa série.
Mas também há uma revolução silenciosa
As escolhas de Christiane Amanpour são interessantes porque vão de Berlim, considerada a capital mundial do sexo livre, onde a cultura BDSM é forte, até Acra, em Gana, onde há 20 anos ela mesma assistiu a um costume trágico para as meninas.
Elas eram dadas como escravas sexuais aos líderes tribais em pagas por crimes que seus parentes cometiam. E nessa série há um reencontro emocionante com uma dessas meninas que Christiane entrevistou há duas décadas atrás (ponto auge, clímax total da série).
Ficou bem notório que o empoderamento feminino é um movimento mundial. Está em todas as partes do globo, gritando sob as burcas, no mercado de peixes, entre as jovens indianas e libanesas.
Na China, onde a sexualidade ainda é servil a manutenção da família, jovens fazem cursos para aprenderem a namorar e escolher parceiros, já que vem de uma história milenar de casamentos arranjados.
Portanto meus queridos leitores: viajem com “Christiane Amanpour em Amor e Sexo pelo Mundo” para se sentirem parte desse universo desejante. Pode ser que você descubra que tem mais motivos para ser feliz do que está imaginando.
E quer mais um conselho de ouro? Não maratone. Deguste um dia para cada país diferente. Mergulhe em cada cultura. Para mim foi um grande aprendizado, já que hoje nem precisamos de sair do Brasil para conviver com pessoas dessas culturas. Elas estão aqui com a gente, na rua, no metrô, no trabalho.
Antes de tudo, a lição maior dessa série é a tolerância. Coisa que ainda faltando muito em todos nós.
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