Em um mundo cada vez mais conectado, onde a informação flui a uma velocidade vertiginosa, é alarmante descobrir que ferramentas projetadas para proteger, na verdade, silenciam as vozes que buscam educar. Nós, do portal Mercado Erótico, não poderíamos ficar alheios a essa contradição perigosa. Por isso, trazemos, através do texto da psicóloga e educadora sexual Tatiana Presser , uma análise profunda sobre como os algoritmos das redes sociais têm falhado miseravelmente em sua missão.
O recente vídeo-denúncia do youtuber Felca, que trouxe à tona a urgência de combater crimes sexuais online, é apenas a ponta do iceberg. A verdadeira raiz do problema é a ignorância sexual. E a ironia é cruel: quanto mais um conteúdo é ético, embasado e transparente, maior o risco de ser penalizado pelo sistema , enquanto discursos predatórios conseguem permanecer no ar.
Convidamos você a mergulhar nesta leitura essencial. É um chamado para refletir sobre a importância da educação sexual como ferramenta de proteção social e para entender como a falta de distinção entre crime e ciência, exploração e prevenção, nos prende em um ciclo vicioso e perigoso.
“A contradição que silencia: quando o algoritmo pune o educador e premia o predador”
O recente vídeo-denúncia de Felca trouxe à tona, de forma contundente, a necessidade urgente de combater a adultização e outros crimes sexuais que se perpetuam nas redes sociais. No entanto, se quisermos chegar a soluções realmente eficazes, precisamos ampliar o olhar. Não basta apenas reagir ao sintoma; é imprescindível tocar na raiz do problema — a ignorância sexual.
Vivemos em uma sociedade que, paradoxalmente, se indigna com casos de exploração sexual, mas mantém a educação sexual relegada à marginalidade do debate público. E
essa contradição se reflete de maneira ainda mais aguda no ambiente digital, onde as plataformas se tornam, ao mesmo tempo, palco e filtro. O algoritmo, supostamente projetado para proteger, falha ao não discriminar entre conteúdos criminosos — que lucram
explorando a vulnerabilidade de menores de idade — e produções legítimas, de caráter científico e educativo, elaboradas por sexólogos, psicólogos e educadores.
Essa indiscriminação não é apenas uma falha técnica; é um entrave estrutural que inviabiliza a disseminação de informações capazes de prevenir justamente as situações que se deseja erradicar. Enquanto profissionais sérios enfrentam bloqueios, suspensões e
exclusões sistemáticas de conteúdo, indivíduos com intenções ilícitas mostram-se capazes de explorar brechas, manipular formatos e driblar as restrições com mais facilidade.
A ironia é cruel: quanto mais um conteúdo busca ser ético, embasado e transparente, maior o risco de ser penalizado pelo sistema. Já os discursos que se revestem de códigos, gírias
e subterfúgios — com intenção claramente predatória — conseguem permanecer no ar por mais tempo, alcançando públicos vulneráveis e/ou com intenções exploratórias.
No cerne dessa problemática está a visão reducionista que ainda persiste sobre sexualidade. O desconhecimento generalizado a transforma em tabu, e o tabu se transforma em terreno fértil para a manipulação e o abuso. Combater crimes sexuais sem investir massivamente em educação sexual para a grande massa é como tentar conter uma enchente apenas enxugando o chão: uma ação reativa, limitada e fadada à repetição do problema.
Se quisermos verdadeiramente proteger crianças, adolescentes e adultos vulneráveis, precisamos reconhecer que educação sexual não é um “tema opcional” ou “conteúdo sensível” a ser escondido. É uma ferramenta de proteção social. E, no contexto digital, isso significa exigir das plataformas a capacidade de distinguir, com precisão e responsabilidade, o que é crime do que é ciência, o que é exploração do que é prevenção.
Enquanto essa distinção não existir, estaremos vivendo uma contradição perigosa: a de punir quem quer prevenir, enquanto deixamos espaço para quem quer explorar.
Como avançar:
Para reverter esse cenário, é urgente que a comunidade de sexólogos e educadores
sexuais se organize para:
- Pressionar as plataformas a criar sistemas de moderação com especialistas da área, capazes de avaliar nuances e diferenciar conteúdo educativo de material nocivo.
- Estabelecer protocolos claros para denúncias de remoção indevida de conteúdo educativo, garantindo prazos curtos para revisão humana e reposição do material.
- Unir forças institucionalmente, formando associações ou conselhos que possam dialogar com empresas de tecnologia e órgãos reguladores de forma representativa e estratégica.
- Educar o público sobre essa censura invisível, para que mais pessoas compreendam que limitar a educação sexual não combate o crime — pelo contrário, o favorece.
Enquanto não houver essa mobilização, continuaremos presos à contradição perigosa de punir quem quer prevenir, enquanto deixamos espaço para quem quer explorar.
Tatiana Presser (https://www.instagram.com/tatianapresser/)
Psicóloga & Educadora Sexual

Tatiana Presser é psicóloga e educadora sexual, com mais de 20 anos de experiência em saúde íntima e bem-estar. É autora do livro “Vem Transar Comigo”.
Em parceria com o marido, o humorista Nizo Neto, ela desenvolveu uma linha de cosméticos sensuais e produtos eróticos, chamada “Vem Transar”. A linha foi inspirada em seu livro e na peça de teatro “Vem Transar Comigo”, na qual ela e o marido atuaram. Tatiana já foi entrevistada por diversos veículos de imprensa, como o “Programa do Jô” e a TV Gazeta, onde falou ao lado de Nizo Neto sobre sexo e a importância da educação sexual.